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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Bruxaria, Magia e Xamanismo - parte 1 - por Nuvem que Passa


Xamanismo, Bruxaria, Magia. Estes três termos são muito usados hoje em dia e existe uma grande similitude entre as pessoas que se aproximam destes caminhos. Vamos refletir juntos sobre este tema começando pelo ato de falar, sobre o ato de trocar informações através de palavras.

Xamanismo é uma palavra. Ela indica, alude sobre algo, mas não é esse algo. Água é uma palavra.

A palavra água pode te fazer lembrar da substância em si, mas não pode mitigar sua sede. Assim como a lembrança mental da água e a imagem da mesma também não o podem fazê-lo.

Quando uso a palavra água a sua mente acessa memórias, experiências já vividas com esta substância. Ao especificar água quente limito o leque de opções. Água fria leva a outro tipo de lembranças.

Pense na água. Imagine a água. Visualize que bebes um copo de água. Agora, se quer mesmo estabelecer uma comunicação mais ampla entre nós, levanta e vai tomar um copo de água. Se fizeres isso vais notar como é totalmente diferente lidar com um conceito, como o da palavra água e tomar água de fato. Portanto o termo água alude a algo efetivo que existe, com o qual tu tens contato, mas não tem o mesmo valor de resolução.

Não mitigas a sede com palavras, só com a substância. Da mesma forma os termos Xamanismo, Bruxaria e Magia não podem ser completamente compreendidos só com abordagens teóricas.

Vamos aludir, vamos nos aproximar, vamos mesmo demonstrar certos fatos de tais práticas, mas note que a compreensão profunda só virá quando tu, que lês estas linhas, fores também alguém que sente a ARTE em tua essência.

Esta é uma abordagem que somente os praticantes podem contemplar plenamente. Porque, em primeira instância, estas três formas de caminhar na existência fazem parte de uma mesma faceta tradicional do conhecimento, a qual transcende toda e qualquer forma de conceitualização. Assim optamos por chamar este o “SABER DOS SABERES”, o qual inclui tudo aquilo que podemos conceber como ARTE.

A ARTE é pois Filosofia, Ciência e Mística. Arte em sua mais plena expressão. Durante nossa era decompusemos a abordagem da realidade nestas formas. Ou abordamos a realidade filosoficamente ou cientificamente, ou misticamente ou artisticamente.

Em resposta à extrema dependência de uma abordagem mística da realidade, típica de certos séculos anteriores, que em verdade é apenas ‘misticóide’, esta Era se esforça por ficar limitada ao que chamam de “concepção científica da realidade”. Insistem em tentar provar que campos como os fenômenos paranormais são ‘científicos’.

Mas a questão central é que, os paradigmas nos quais se apóiam para caracterizar algo como científico contradizem até mesmo as bases da própria noção de ciência, já que a busca de respostas verdadeiras deveria ser a premissa fundamental da ciência, ao invés da manutenção de uma ideologia dominante para manter sociedades inteiras servis.

O Xamanismo, a Magia e a Bruxaria foram perseguidas, e ainda são, em muitos setores desta sociedade que aí está. Vejam as campanhas constantes contra terreiros de Umbanda, Candomblé e movimentos Nova Era por parte dos segmentos mais fundamentalistas de certas religiões em franco crescimento. Estas perseguições são apenas uma das facetas desta luta contra toda forma de trabalho mágico não contemplado pelo paradigma vigente imposto sobre a sociedade.

Esta luta entre campos ideológicos se reflete também na chamada ciência acadêmica, na qual indivíduos com inflados egos influenciam o rumo das pesquisas e no conceituar do mundo, para que certos modelos da realidade não sejam de todo alterados.

O Xamanismo, a Magia e a Bruxaria são formas de abordar a realidade que têm sido perseguidas há tempos em diferentes civilizações. Por que tais caminhos despertam tanto medo? Observando com atenção notamos que sempre que se estabelece um regime absolutista, desejando impor sua vontade privada sobre a vontade coletiva, tais caminhos são os primeiros a serem perseguidos. Toda vez que o poder despótico se faz sentir, os caminhos citados são perseguidos. Os povos nativos continuam sendo oprimidos até hoje. Destruídos enquanto cultura e enquanto vidas, mortos em conflitos diversos.

A Magia e a Bruxaria ganharam espaço entre certas camadas sociais e acabaram fazendo uma lenta migração de volta ao sistema dominante, ressurgindo com força entre vários magistas e bruxos que vem alimentando a cultura oficial com obras nas quais narram suas aventuras e descobertas na vastidão de outras realidades que circundam a nossa.

Lendo os autores originais, e não aqueles que baseiam suas ‘descobertas’ apenas na leitura de outros, ou seja, aqueles que  empreendem uma maior aproximação da fonte a partir da qual tais informações emanam, vamos notar questionamentos profundos sobre a vida, a morte, a consciência, a realidade imediata, a existência de realidades outras que não esta, assim como outros seres habitando mundos ao redor deste. Seres alienígenas à nossa realidade porém presentes em nossa própria realidade mas não perceptíveis a nós. Muitos temas foram investigados por vários indivíduos, homens e mulheres que tiveram acesso a fragmentos de informações, outros à escolas autênticas possuidoras de elos com a ancestralidade da qual este SABER emana. Muitas linhagens diferentes foram contatadas por estas pessoas que tinham em si o ímpeto de aprender mais sobre os mistérios que nos circundam e a escrever sobre isso.

Upasika¹, Aleister Crowley, Therion²; Fernando Pessoa, na multiplicidade; mais recentemente Carlos Castañeda, também conhecido como Charles Spider; entre muitos foram sondar outras realidades e acabaram encontrando de fato abordagens da realidade completamente diferentes das que esperavam.

O Xamanismo, a Magia e a Bruxaria, tal qual são concebidos e praticados hoje, sofreram profunda influência destas pessoas, pois foram elas que fizeram as primeiras traduções dos conceitos ancestrais destes caminhos para a sintaxe da nossa cultura. Quando colocados na sintaxe da nossa cultura, tais informações adquirem mesmo um caráter de revelação.

Re-Vela. Indica, alude, mas também confunde, coloca o véu novamente, pois definir estes caminhos e falar sobre eles pode nos levar a realizarmos falsas associações, re-significações e interpretações a respeito destes caminhos de acordo com nossas presunções, e a partir daí, alienar ainda mais em vez de despertar. Tanto no Xamanismo, como na Magia como na Bruxaria a primeira premissa é que só pode trilhar estes caminhos Aquele que ‘É’. Em todas as obras produzidas sobre estes caminhos vamos perceber que, de forma declarada ou subliminar, o instrutor sempre começa guiando o(a) aprendiz a deixar de ser apenas uma resultante dos condicionamentos do meio, dos inúmeros fatores que afetaram sua existência até então, para somente assim estabelecer um ‘EU’ real.

Alguns lidam com uma viagem pelas esferas da Árvore da Vida e do Tarot para este trabalho, no qual o ser, que tal caminho trilha, lida com seus medos, condicionamentos, carências, vaidades e vai se reintegrando, resolvendo sua sombra, e, então, após atravessar o abismo no qual deve despir-se para tornar-se ‘si mesmo’, emerge como um novo ser. Aquele que ‘É’! Só então começa a magia. Antes havia apenas um agitar semiconsciente da luz astral, do grande mar de energia que nos circunda e gera, ao redor de nós, uma atmosfera psíquica que pode gerar fenômenos diversos, mas que é também uma grande ilusão, Maya, um mitote³.

Este fato é muito importante. Tanto no Xamanismo, como na Magia como na Bruxaria, o primeiro passo é deixar de meramente sobreviver para VIVER, deixar de reagir para AGIR.

Esse lembrar de si, esse resgatar a nós mesmos e ir além das ilusões que aí estão, é a condição básica para que haja Xamanismo, Magia ou Bruxaria.

Xamãs, Magistas e Bruxos(as) são homens e mulheres que antes de mais nada, ‘SÃO’. Para poderem operar efetivamente no domínio desses caminhos têm que ‘SER’, ou serão destruídos quando as fronteiras da realidade se expandirem. 

A VONTADE é o começo de tudo, a mais fundamental conquista que um(a) Xamã, um(a) Magista ou um(a) Bruxo(a) deve ter realizado para não ser destruído pelos poderes e esferas com as quais pretende interagir. VONTADE em um contexto diferente do comumente expresso. Não tem nada a ver com desejo, volição ou qualquer outra forma de expressão que conheçamos.

Tanto quem trilha o caminho do Xamanismo como da Magia como o da Bruxaria sabe que VONTADE aqui tem outro sentido, outro significado. É a forma pessoal que cada um tem de expressar um poder muito maior, que é a própria ‘VONTADE da Eternidade’ que nos circunda.

Só quem ‘É’ pode ter VONTADE. Este é um sentido que escapa a muitos leitores das obras de quem esteve estudando esses caminhos e sobre eles escreveu. 

Vejam Crowley: 

“Faze o que tu queres…”

Esse ‘Tu’ é um conceito complexo. Indica que existe alguém de fato, e não apenas um aglomerado de estilos de emocionar-se, raciocinar e reagir ao qual nos referimos como ‘eu’.

Lendo Erva do Diabo e Uma Estranha Realidade, milhares de pessoas pelo mundo ficam a vagar erraticamente ao se super estimularem com plantas de poder diversas, crendo que o ‘espírito da planta’ vai lhes revelar algo que não sabem. Mas o cerne abstrato do aprendizado ali era outro. Tudo ali estava sendo usado como meio de trabalho por alguém que tinha maestria na ARTE. Assim ficar preso em leituras literais de qualquer obra que toque a ARTE é como ser um fundamentalista e basear sua vida em interpretação literal de textos adulterados que foram escritos em outra cultura.

O que chamo atenção, é que, antes de atabalhoadamente irmos a definições e diferenças entre Xamanismo, Magia e Bruxaria temos que repensar nossos paradigmas. Nossas bases conceituais sobre as quais assentamos nossa compreensão de mundo. 

Uma condição fundamental é compreender que quando estamos falando de XAMANISMO, MAGIA e BRUXARIA no contexto dessas linhagens que tem de fato ligação com a ARTE, existem pontos muito interessantes de semelhança entre ambas que tem sido deixados de lado. Vamos a eles.

O primeiro deles é o fato que todo caminho que leva a ARTE começa por auxiliar o ser que trilha tal caminho a se desvencilhar do pesado passado que carrega consigo, da insana absorção em conceitos prontos e de condicionamentos estáticos que foram implantados em cada ser humano nesta Era de escravos em que vivemos.

Aqui tocamos em um ponto sensível. Todo sistema feitor de escravos sempre lutou arduamente para destruir tudo ligado ao Xamanismo, Magia e Bruxaria. Por quê? Por serem caminhos de LIBERDADE. Aqui temos outra definição importante. O Xamanismo, a Magia e Bruxaria sempre foram caminhos de homens e mulheres livres. Que alguns desses homens e mulheres tenham caído em formas de prisão muito mais sutis e perigosas que a prisão deste mundo ao tentarem se aproximar da ARTE é um fato. O qual alerta a todo praticante que arrogância e presunção são estilos de comportamento que nos dirigem diretamente para as iscas que existem no vasto mar que vamos descobrindo quando nos dedicamos a ARTE.

Tanto o Xamanismo como a Magia e a Bruxaria apresentam diversas formas de manifestação. Existem também muitas formas de cultos que nada têm a ver com a essência do Xamanismo, da Magia e da Bruxaria, mas que, ainda assim, se apresentam como tal.

Temos, no tocante da Bruxaria, o agravante de ter sido fortemente deturpada pelas falsas acusações e testemunhas sob o terror de tortura, ou mesmo sob a ameaça dessa. Criando fantasias sem fim que serviam bem aos propósitos dos que desejavam incitar o medo contra tais práticas e conhecimentos. Na Magia temos deturpações como ‘magia negra’. Criação também da Inquisição que ainda hoje assusta a tantos. No Xamanismo, temos um grande número de índios que imitaram formas de agir sem compreender a essência dos verdadeiros xamãs, e assim, repetem hoje ritos e formas, mas sem o poder que caracteriza toda ação de fato xamânica. Mas além destas deturpações temos o XAMANISMO de fato, a MAGIA de fato e a BRUXARIA de fato, sobre estas facetas da ARTE é que falamos aqui. 

Nuvem que Passa - 28/01/2001

Notas

¹ Upasika Kee Nanayon ou Kor Khao-suan-luang foi uma upāsikā (devota e seguidora autodidata não ordenada da tradição búdica theravada) tailandesa de Ratchaburi (1901 – 1978). Após sua aposentadoria em 1945, ela transformou sua casa em um centro de meditação com sua tia e seu tio. Suas palestras e poesias sobre o Dharma eram amplamente divulgadas. Tornou-se uma das professoras de meditação mais populares da Tailândia. Muitas de suas palestras foram traduzidas para o inglês por Thanissaro Bhikkhu, que a considera “indiscutivelmente a principal professora do Dharma na Tailândia do século XX”.

Upasika também é um dos termos que os Mestres ou Mahatmas usavam para referirem-se à H.P. Blavatsky. A influência de Blavatsky foi e é enorme para a cultura ocidental dedicada ao estudo das tradições antigas do Oriente. Fundadora da Sociedade Teosófica, escritora da obra "A Doutrina Secreta", dentre outras. Upasika = servidora, aquele que serve.

² Therion (thēríon) (grego: θηρίον, besta) é uma divindade encontrada no sistema místico de Thelema, que foi estabelecido em 1904 com “O Livro da Lei” escrito por Aleister Crowley.

³ Mitote, segundo Dom Miguel Ruiz, autor do livro "Os 4 Compromissos":

"Toda a sua mente é um nevoeiro que os toltecas chamam de mitote. Sua mente é um sonho em que mil pessoas conversam ao mesmo tempo, e ninguém entende o outro. Essa é a condição da mente humana — um grande mitote. Graças a ele, você não consegue enxergar o que realmente é. Na Índia, o mitote é chamado de maya, que significa “ilusão”. É a noção pessoal do “Eu sou”. Tudo em que você acredita sobre si mesmo, sobre o mundo, todos os conceitos e programas que você tem na mente, todos formam o mitote. Não conseguimos ver quem realmente somos; não conseguimos perceber que não somos livres."

⁴ É muito difícil compreender esse ponto relativo ao SER, pois como alguém que não é pode vir a entender o que É? A simplicidade das palavras aqui pode ser muito enganosa. Talvez uma história possa nos ajudar a entender esse ponto. A história está no último capítulo de Viagem a Ixtlan, trata-se do encontro de Dom Genaro, benfeitor xamânico de Carlos Castaneda, com o aliado, entidade de natureza inorgânica que auxilia o xamã em suas atividades. Para SER é necessário que haja em nós um centro de gravidade permanente, um núcleo ao redor do qual o SER possa se estabelecer e este é mesmo um dos objetivos do TRABALHO sobre si.



domingo, 7 de janeiro de 2024

Sabemos, realmente, que somos mortais?


Sabemos, realmente, que somos mortais?

O fato da morte, da dissolução ao final desta existência nos coloca em um ponto completamente diferente de todos os caminhos tidos por espiritualistas e esotéricos hoje em moda.

"Espreitamos a nós mesmos como seres mortais ou imortais?"

A diferença do enfoque desta espreita é determinante em nossas posturas existenciais.

Conversando com muitas pessoas em situações diversas noto muitas delas alegando que trabalham com os paradigmas toltecas, mas neste ponto da continuidade da existência tentam sempre elocubrar, tergiversar, enfim, há sempre um "medo" de encarar a morte como o evento que dissolve nossa existência individual.

Concordo contigo na reação a esse fato, há um "sobressalto" inicial, por vezes assustador, mas logo depois vem a certeza que tudo que temos é esse "aqui e agora".

É tão profundo este jeito de viver, de se relacionar com o mundo, cada instante, cada momento, pode ser o momento final, pode ser o ponto final em nosso discurso existencial, assim, para alguém que lida com esta abordagem do caminho, não há dúvida que cada instante é tudo que temos e a qualidade de nossa vida em cada momento determina se estamos fluindo pelo Mar Escuro da Consciência ou continuamos na condição de navegantes num rodamoinho artificial, que nos leva para o fundo tendo a ilusão que estamos indo para algum lugar.

Está demonstrado que a energia disciplinada e focada é "ruim" para os predadores, eles não apreciam esse estilo de comportamento, assim agir com foco e disciplina é impregnar nossa energia pessoal de um "gosto" que não agrada os predadores.

Quando nos conscientizamos que só há o aqui e agora, tudo muda.

Descobrimos que não podemos perder tempo, não podemos nos manter num caminho sem coração, pode não haver um amanhã ou um "depois" para dizermos a quem amamos, o tanto que amamos, para fazer em cada momento de nossas vidas o que queremos e não o que querem por nós.

Precisamos olhar a nossa realidade circundante e corajosamente questionar : estou num caminho com coração?

É aqui que gostaria de estar?

Se houver um não como resposta a questão é: por que não mudamos já?

Ou estamos esperando papai do céu?

É radical, é revolucionária a proposta de vida daí resultante.

Sem dúvida alguma é a plena compreensão desta abordagem que nos dá a força e a integridade para fazermos de cada ato um gesto para o infinito, um gesto para a Eternidade.

É muito bom enfatizar isso pois tem pessoas que se aproximam das propostas Toltecas achando que estão em alguma religião que se "seguirmos os preceitos" encontraremos alguma "recompensa", "reinos do céu", " prêmios sagrados".

Total ilusão.

Um trabalho de vida inteira pode resultar em nada, pode levar a lugar nenhum.

É interessante compreender que pode haver um sobrevivência de personalidade após a morte física.

Temos muitos casos em várias tradições de seres que continuam a se comunicar após a morte, mas o que o caminho Tolteca coloca é que nestes casos temos "filamentos" sobrevivendo, os mesmos filamentos que voltam para a Eternidade um dia, os mesmos filamentos que vão e voltam, "encarnado" em outros seres e confundidos com "minha vida anterior" pelas práticas reencarnacionistas.

O conjunto de fibras que "animamos" durante a vida pode se cristalizar, há cristalizações de vários tipos, este ser pode sobreviver se, por diversos caminhos, tivermos criados um corpo de energia, vai sobreviver ainda mais tempo se certas medidas forem tomadas, vejam o trabalho dos ancestrais em mumificar o corpo ou agir de formas outras para garantir que o corpo dure por muito tempo.

Mas todas estas práticas apenas geram uma sobrevida, não a pretensa imortalidade.

No Fogo Interior D. Juan Matus revela uma linhagem de desafiadores da morte que enterraram seus corpos físicos em certos locais do México, o problema dessas práticas é que levam a um estado de continuidade, mas não de liberdade.

A sutileza do Caminho Tolteca, revolucionariamente ele não apenas trabalha as questões dos(as) desafiadores(as) da morte mas foi além, descobriu esta possibilidade, essa chance que temos de ter chance de reivindicar o "presente da águia", podermos entrar noutra condição de atenção, noutra condição de realidade que não é nem a primeira atenção, esta que nos circunda, nem a segunda atenção, que abrange mundos outros que não este, mas um estado misterioso, chamado de terceira atenção, onde, após morrermos e abandonarmos esta primeira e segunda atenção, após devolvermos a consciência que nos foi "emprestada" para a desenvolvermos com nossas experiências, podemos reivindicar, se tivermos energia e intento para isso, um estado existencial distinto.

Mas tudo isto são possibilidades, algo que "pode" acontecer, para o qual não temos nenhuma certeza.

Por isso, a meu ver, o (a) praticante do caminho Tolteca, intenta estes objetivos com sua mais profunda percepção e isto reflete na VIDA.

Para meu entender, praticar as propostas do Caminho Tolteca é um ato de cada instante, de cada momento, cada mínimo ato é um profundo desafio.

Ler este mail, a postura que estamos, nosso cocar colocado, nossa sintonia, atos simples como lavar um copo, andar, estar onde estamos, tudo isto é tido como um desafio, como um trabalho para ampliar a consciência e nos afastar da condição robotizante que é a " normal" e nos despertar para as tremendas possibilidades ao nosso alcance.

Fomos condicionados a agir como máquinas, em vários setores de nossas vidas, estar aqui e agora, pleno, isto muda tudo, se nos conscientizamos que a vida é única, que esta vida é tudo que temos de fato, que este momento é nosso único e efêmero instante, tudo muda, nossa qualidade de existência se transforma para outros valores e podemos ousar deixar de sermos robôs e entrarmos na condição distinta de seres vivos, auto-conscientes.

Estou numa empresa que dou consultoria em São Paulo. Fico observando como as pessoas são sugadas na cidade grande para estarem mais robotizadas, fora dos ciclos da natureza.

Agora enquanto escrevia este mail fui até a linha de produção passar para eles uns exercícios físicos de alongamento, destinado a evitar LER (lesões por efeitos repetitivos).

Fiquei observando como as pessoas fazem as coisas automaticamente, nestes momentos que paramos para estes exercícios há uma mudança do "automatismo", por alguns instantes elas estão ali mais presentes, o sorriso, os comentários, é incrível observar como a energia muda por alguns instantes.

Mas alguns instantes depois já voltam a uma participação mais "dormente".

E nós?

Como estamos?

O dia todo, cada instante é um desafio ou temos "momentos" e depois permitimos que os "problemas" do dia a dia, nossas atividades outras nos consumam e nos adormeçam?

O desafio do (a) praticante de caminhos como o Tolteca é justamente ir além do automatismo, é despertar de fato para nossas potencialidades interiores.

Só aí temos vida, antes temos sobrevivência.

É muito interessante observar isso.

Não fomos "criados" para este estado, não é nosso destino "evoluirmos" para esta condição.

Não é um “caminho" espiritual.

O Caminho Tolteca é uma descoberta, resultado do estudo, da observação, dos erros e acertos de gerações incontáveis de homens e mulheres.

É muito trabalhoso porque não é "natural", é um caminho de desafios constantes e crescentes.

É muito importante entender isso, o Caminho Tolteca não é uma "revelação".

Se estudamos com cuidado vamos notar que no começo o caminho Tolteca ajudou a induzir muito erros, vejam os ancestrais desafiantes da morte, as armadilhas sutis que caíram.

Notem por exemplo quantos praticantes caíram no mundo dos seres inorgânicos, os desafios iniciais quando julgavam que a segunda atenção era um mundo "espiritual", "superior", como tantos caminhos ainda hoje julgam ser, enfim, tais equívocos só foram superados pela prática e observação de incontáveis gerações.

E é interessante observar que muitas práticas que são apresentadas como Xamanismo hoje, são abordagens dentro desses paradigmas ancestrais.

Os (as) Toltecas não foram apenas um povo no sentido étnico. A comunidade xamanística Tolteca foi um estado de consciência, atuando em vários pontos de uma vasta região.

Eventos intensos foram forçando mudanças perceptivas quanto a realidade.

Foram momentos duros, como a invasão e subjugação, primeiro pelos povos nativos mesmo, como Astecas e outros, depois pelos conquistadores europeus que levaram o Caminho Tolteca a afastar-se de tudo que era mera fantasia e buscar um pragmatismo cada vez maior e efetivo.

Dentro de sua tribo os(as) Toltecas eram capazes de manipular o ponto de aglutinação de todas as pessoas que estavam ali, mas quando chegaram os invasores tudo mudou, poderosos(as) xamãs morrendo como moscas.

Os(as) sobreviventes foram então avaliar, avaliar como eles sobreviveram e os outros não, como seus " aliados" os ajudaram e aos outros não e então muita coisa mudou, pois começaram a perceber que a questão chave estava no "poder pessoal".

Hoje somos herdeiros desse caminho, os novíssimos videntes.

Os antigos videntes, adeptos de práticas que valorizavam mais os fenômenos e o contato com a segunda atenção como se ela fosse um mundo "espiritual" e tal, evoluiu para o caminho dos novos videntes, quando sob ataque de grupos diversos os herdeiros e herdeiras do Caminho foram se aprofundando em práticas mais profundas e de efeitos pragmáticos e hoje, graças a ação implacável do Nagual de 3 pontas, podemos partilhar deste milenar saber e arriscarmos nossa chance de continuar a aventura que nos é proposta, a chance de termos chance.

Cá estamos, praticantes deste desafio intentando esse sonho fugidio.

Nuvem que Passa
 Qui Jul 4, 2002 10:17 am

Homenagem à Morte com Mantra



domingo, 31 de dezembro de 2023

Egrégoras e energia natural - parte 2 (final)



Egrégoras e energia natural - parte 1 (no link).

Existem diversas realidades, esta mesmo que vivemos tem variações e existem mundos paralelos tão parecidos com esse que sei de xamãs que acordaram nestes mundos e nunca mais voltaram para este e nem ficaram sabendo disto.

A densidade e a "vaporozidade" dessas realidades é relativa e depende do ponto de vista do observador, de onde vem e para onde vai. Efêmero me parece tudo que existe frente a vastidão da Eternidade.

Quando falamos em "mundos que geram energia" e "mundos que não geram energia" ou "mundo espectrais" é justamente para diferenciar mundos que tem relação com as propostas dos(as) xamãs que sabem ser importante ampliar sua própria energia pessoal e mundos que apenas consomem o poder pessoal do (a) xamã nada lhe acrescentando.

Assim a discussão no xamanismo vai mais longe que "realidade" ou "não realidade" e falamos de realidades condizentes com a estratégia de vida de um (a) xamã que busca a liberdade total e realidades não condizentes com esta proposta.

É bom lembrar que xamãs guerreiros(as) agem sempre por estratégia, não por princípios. Grande parte do treinamento inicial de um(a) xamã guerreiro(a) é aprender a ver a energia diretamente, além das barreiras da socialização. Este "ver" é interessante... Muitas vezes sonhei em ter a tal "clarividência" e a vez em que vi, de fato, me apavorei tanto, que me neguei a ver de novo... Tudo isto para anos mais tarde...livros e vivências depois... perceber que o "ver" independe de olhar... independe de forma visual... Muitas vezes é como um rastro de perfume, que passa por vc e pode ser deslocado no momento seguinte com uma simples brisa... Muitas vezes é como um toque suave de uma pluma invisível. Este "ver" deve ser constante e não basta apenas o "ver" que surge momentaneamente... E esta deve ser a maior dificuldade. Sim, VER aqui é um modo de dizer, como o sentido visual predomina em nossa estrutura "ver" acaba sendo usado para descrever esse estado de consciência que não é apenas visão, é o corpo inteiro percebendo a realidade. Ver acontece quando calamos nosso diálogo interno, quando paramos de dizer para nós mesmos o que nos disseram que era o mundo, então, outra descrição, esta mais ancestral, vinda da noite dos tempos, emerge, silenciosa em nosso interior e nos leva a perceber o mundo de forma completamente diferente da que até então estávamos habituados, para alguns caminhos isto é chamado VER, mas é mais que o sentido restrito do termo.

Mas uma egrégora não gera energia por si. Ela é alimentada, é resultante, daqueles que a geram e a mantém. Posso deduzir então que ela exige um esforço maior... Que pagamos um preço por nossas pequenas criações. Enquanto, se seguirmos o fluxo... se seguirmos a estranha e invisível estrada que guia os pássaros no inverno e os peixes na época da reprodução, então, realizaremos nosso objetivo com mais facilidade, menos desgaste e profunda harmonia com o Todo. Correto dizer isto? O Taoismo e o Xamanismo Guerreiro lidam exatamente com esta proposta, descobrir os fluxos do Tao ou do Intento e buscar fluir em harmonia com eles. Note porém que não é uma proposta passiva no sentido de apenas "seguir" é muito mais complexo que isso, por isto estes temas tem que ser abordados com todo o cuidado, a mente comum do ser humano, esta instalação alienígena que trabalha muito mais contra nosso despertar que a favor, não pode querer decodificar as coisas aqui em seus parâmetros, precisamos mergulhar em nosso sentir, na profundidade de nós mesmos para compreender mesmo o que tais termos como "fluir com o Tao" querem realmente dizer.

Ordens iniciáticas realizam ritos com certos padrões comuns em todas suas secções entre outras coisas para alimentar a mesma egrégora, fortalecer a "alma grupo" da irmandade.

Isso acontece em muitas ordens que dizem ser da "mão direita", não por "maldade", mas por desconhecimento de muitos que dela fazem parte. Com a pretensão de serem os "bonzinhos", logo os favoritos e especiais do universo, tais ordens deixam de explicar que fazem parte das mesmas leis que todas as outras formas de manifestação humana e que a energia é usada nestes grupamentos dentro de certas leis, como estas que comentamos. Há um dado mais sério aqui, muitos dos ritos dos povos nativos foram criados com finalidades específicas para um povo e região. Esses ritos foram criados para que tais pessoas naquele momento e naquela região se sintonizassem com poderes específicos. Outros ritos foram gerados para dar continuidade a função do ser humano enquanto vida orgânica sobre a Terra, captar energia que vem da Eternidade, metabolizá-la e entregá-la a Terra, ao Ser Terra e vice versa, captar energia do Ser Terra e metabolizá-la para que possa seguir a escala ascendente. Assim existem ritos que até hoje são celebrados por imitação que serviram em um tempo e espaço para funções que hoje estão perdidas, tais ritos viram um simulacro, onde podemos "agitar a luz astral", mas pouca coisa além conseguir. Tudo isso deve ser meditado antes de nos pormos a fazer ritos de ordens e "irmandades", ritos que algum pesquisador "catou" em livros ou assistindo pessoas que imitaram a forma mas perderam, em alguns casos, o conteúdo. Povos inteiros guiados pelos seus homens e mulheres xamãs deixaram essa realidade e foram viver em outros mundos.

Esta é a essência de todo o xamanismo guerreiro, assim como do Taoismo que estou aprendendo e de ramos esotéricos do Budhismo, de certas escolas de Yoga e de tantos outros caminhos chamados de iniciáticos. A imortalidade, ou melhor dizendo, a continuidade de nossa existência singular é "possível", é "alcançável", é "atingível" mas precisa de muito, muito trabalho e é este trabalho que o caminho do xamanismo guerreiro propõe.

Somos criaturas de sintaxe. Eu noto que alguém está realmente entrando no Caminho da ARTE quando começa a questionar as palavras, o vocabulário que usava, quando começa a perceber o quando estava enredado em frases e definições que nada diziam de fato. Questionar as palavras, o falar é questionar as bases paradigmáticas que nos deram, toda ela construída em palavras. Só depois de termos lidado conscientemente com as palavras podemos ir questionar e lidar com outros níveis de condicionamentos que temos, estes não verbais.

O fato é que o trabalho do xamanismo (guerreiro) é muito árduo porque ele é sem esperança, sem ilusões, luta-se por uma possibilidade, por um sonho que pode nunca ser atingido, mas com desprendimento e desapego lutamos com total foco na liberdade. Uma pessoa pode sobreviver a morte enquanto personalidade. E é aqui que o xamanismo guerreiro entra deixando claro um ponto. Uma personalidade é como um único programa dentro de seu computador, digamos o office. Vc usa muito o office e ele acaba sendo sua identidade. O computador quebra e o office se salva e instalado num novo computador. O office pode até mesmo sobreviver fora. Mas frente a riqueza que é um computador, tudo que há nele, todos os programas, o office é uma ínfima parte. Foi isto que os(as) xamãs guerreiros(as) descobriram após milhares de anos observando. Este tipo de sobrevida era uma farsa, a Totalidade do Ser era perdida e só um aspecto continuava. Isso levou os(as) desafiantes da morte a buscarem outros caminhos. Alguns povos, como alguns grupos e mesmo alguns xamãs isoladamente, criaram na amplitude da "Segunda Atenção" ilhas de existência.

É impossível falar da segunda atenção, podemos só aludir a ela. Chamamos de primeira atenção a este mundo, todo ele, tudo que percebemos em nossa condição usual de percepção. Existe um campo mais amplo da primeira atenção que não usamos, porque participamos muitas vezes de forma dormente e robótica da vida. A segunda atenção é tudo que vai além da primeira, todas as inenarráveis realidades que habitam as outras camadas da cebola. Os toltecas ensinam que temos dois "anéis" de poder, cada um deles conecta-nos com uma realidade. O primeiro anel de poder é este, que lida com a realidade, nasce e é cultivado em nós e então nos envolve, como uma bolha, fechando dentro de si nossa percepção e passamos a ficar presos nessa "realidade" que foi programada em nós.

As escolas de Xamanismo Guerreiro desenvolveram um método dos mais interessantes para ir ao segundo anel, ou a segunda atenção. Perceberam que grande parte da falha dos antigos e causa de sua queda, foi justamente ir para a segunda atenção com seu "eu" normal, caprichoso e cheio de estilos de agir que tornavam tais homens e mulheres presas fáceis de armadilhas várias que existem num universo predador como o nosso. Então resolveram que o treino de um(a) xamã começa por dividir a " bolha " da primeira atenção em duas metades. Em uma metade ficam todos os conceitos de vida, em outra nada, apenas o vazio.

Então, feito isso o (a) aprendiz se concentra em reorganizar a metade que ficou com os conceitos de vida. Não que possa jogar algo fora, mas pode mudar o enfoque, a importância de certos itens. Pode, por exemplo, afastar a vaidade da posição de conselheira e colocar a Morte. A vaidade vai continuar ali, como a morte estava, mas agora a importância de cada uma é diferente. Então, quando a essência perceptiva tiver reorganizado sua "ilha" vai poder ir para a parte vazia da "bolha" e através dessa parte vazia, isto é, silenciosa, sem conceitos prontos, encarar a Eternidade que existe fora da Bolha. Todos os mundos infinitos que não estão na Realidade Oficial, estão na Segunda Atenção. A primeira atenção é uma área pragmática de atividades para um ser humano enquanto ser humano, enquanto pessoa. A segunda atenção não vem "naturalmente" é fruto de um desenvolvimento proposital e é uma área pragmática de atividades para um ser humano enquanto xamã.

É um dos poderes do Sonhar, poder criar um mundo réplica de um que exista, ou mesmo algo totalmente novo, só pelo poder do Intento do(a) xamã que assim age. Mas tais mundos são mundos espectros, mundos que não geram energia e este é o perigo de se desenvolver em corpo sonhador sem amadurecer primeiro, sem sair dos joguinhos e dos pueris paradigmas que as religiões e as pretensas filosofias espiritualistas nos deram sobre o que são "mundos evoluídos", "mundos superiores" e os "seres de luz e pureza" que nos esperam lá.

Para realmente irmos a um mundo que é espectral temos que ter um corpo de energia, ou corpo de sonho em pleno funcionamento e isto é raro. Este detalhe é importante no xamanismo, para entendermos realmente a ARTE de Sonhar. O ponto de aglutinação pode se deslocar para fibras em nosso interior que nos colocam em outros mundos. Mas vamos ali, nestes outros mundos, enquanto entidades perceptivas, ir com o corpo de energia plenamente funcionando é outra coisa.
Também, aqui valem os ensinamentos de Mestre Yoda: um jedi, como um xamã, usa a "força" para sabedoria e defesa, não para o ataque". Se avaliarmos bem isto implica que o uso da "força" está no conhecer da Eternidade (sabedoria) e no continuar vivo e livre (defesa). Por isso no Xamanismo Guerreiro, não trabalhamos com divindades criadas pelo ser humano, ou egrégoras conscientes, buscamos diretamente na fonte, vamos a Terra, enquanto ser vivo e a seus poderes e manifestações, como ventos, cachoeiras, trovões, montanhas, chuva, vales, enfim, vamos a força manifesta em si, não a "representações" das mesmas.

Isto tem um poder tremendo, somos parte da Terra, não podemos viver sem contato com ela. Por isso os hospitais estão cheios, as farmácias vendem tanto e as pessoas andam tão deprimidas, perderam contato com o SER Terra que é nossa nutridora, que é parte de nós como somos parte dela. Quando recuperamos plenamente nosso elo com o Ser Terra surge um tipo de felicidade em nós, de plenitude, algo que não pode ser ameaçado ou tirado como outros tipos de felicidades, algo que nos torna plenos.

Isso é claro pra mim também, contato direto com a VIDA sem muito efeitos carnavalescos. Os ritos muito elaborados vieram sempre de grupos que estavam menos em contato com a Vida e mais com o intelecto. Tenho percebido que os rituais têm servido para testar a minha disciplina muito mais do que para "despertar poder" ou ampliar consciência. A não ser os rituais que chegam e se apresentam... como uma inspiração... como o vento que sopra no ouvido o gesto certo e a palavra adequada. Aí tb funciona bem! Para os(as) xamãs guerreiros um rito tem uma função principal: Desviar a fixação obsessiva que temos em nós mesmos, quebrar as amarras da auto-reflexão, diminuir o diálogo interno. Esta é a função do rito, pois o que provoca o resultado de um trabalho mágico não é o rito, mas o poder pessoal de quem o realiza e se conseguiu ou não alinhar sua vontade com o INTENTO.

"O xamanismo guerreiro é magia, não pode reconhecer coisas como "rezar" para algum poder. O termo rezar, tal qual é usado hoje, vem num contexto de pedir, de suplicar, de um ser suplicante implorando e chantageando uma força superior, tentando suborná-la com sacrifícios e promessas para que ela ceda e atenda o "suplicante".

Há uma diferença entre "suplicar a uma divindade" com algum tipo de propina para ser atendido e entrar em sintonia com os fluxos da realidade para fluir naquele que leva aos resultados que almejamos.

O Ser Terra é muito mais poderoso que qualquer egrégora humana criada, é mais antigo, mais pleno, e está em sintonias com certos "planos" que nós humanos sequer intuímos existir. Assim quando nos conectamos ao Ser Mundo para agir magicamente estamos na realidade entrando em sintonia com um poder que transcende o humano e tal poder "mais que humano" é uma energia muito mais poderosa para trabalhar no alcançar dos nossos objetivos com o rito que estamos realizando que um poder "humano" por mais ancestral que seja.

É bem interessante isso mesmo, isso é um dos aspectos que nós homens temos que aprender com a força feminina, ser mais maleáveis, fluir com menos rigidez.

Esse minha amiga que está comigo esses dias tem falado muito sobre isso, sobre sentir o Tao, a totalidade que é também consciente de si e que está sempre sinalizando em nosso caminho.

A arrogante civilização dominante programou muito bem as pessoas para acreditarem, como nas cortes, que são superiores por algum conjunto de hábitos bobos que tenham. Assim as mulheres tem sido mantidas exiladas de si e da sua magia enquanto aprendem cada vez mais a serem "machos".

Recuperar tais percepções aliadas a maturidade é um prêmio.

A não arrogância da criança e sua espontaneidade são muito úteis, mas o Deus e a Deusa tem quatro faces, precisamos é recuperar o arquétipo do Guerreiro e da Guerreira, do Curandeiro e da Curandeira, do Ancião e da Anciã, da Mãe e Do Pai, da Amiga e do Amigo, arquétipos que se tornaram meros estereótipos em nossa época.

Nuvem que passa
(escrito em 27/12/2000)

quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

A Deusa sem intermediários / Deusa, Paganismo e Ecologia

Existe um estudo muito sério a respeito do Messianismo¹. Vivemos isso não só nas religiões, mas também na política. É um vício existencial terrível ficar esperando que o Messias salvador venha resolver todos os problemas. A questão desse personagem central passa justamente por essa armadilha.

No Cristianismo o caso é mais sério. Se você provar que Jesus não existiu, acabou o Cristianismo(ver o polêmico e instigante documentário Zeitgeist, no link). Todos os preceitos morais, toda a ideologia cristã depende terrivelmente dessa figura central. Para os católicos e cristãos fundamentalistas a dependência é ainda maior: Jesus morreu para salvá-los, assim qualquer alteração na história de Jesus, como as tradições que dizem que ele não morreu na cruz, que foi tirado antes e foi morar na Índia, onde tem até um túmulo que alegam ser dele, destrói completamente a base dessas religiões².

O Budhismo é um caso mais complexo. Como o Cristianismo, o Budhismo se desenvolveu em muitas e diferentes seitas. Temos desde escolas filosóficas como o Zen até Escolas que acreditam que basta você ficar cantando uns mantras e chamando um certo Budha ( existiram vários além do histórico Sidarta Gautama) e vc está "salvo". O Espiritismo Kardecista quando surgiu não tinha linha filosófica clara. Existem uns escritos de Madame Blavatsky nos quais ela comenta que o espiritismo é tão confuso que iria acabar adotando o Cristianismo como base religiosa... E foi o que aconteceu.

Esse papel torna Kardec um codificador, mas não o coloca numa perspectiva histórica, no mesmo patamar de Jesus ou Gautama Budha, ou Maomé, ou Krishna. Esses seres que cito foram seres semidivinos, seres cercados de uma aura que os colocava num nível muito particular. Jesus é o filho de um Deus tribal, o Deus dos judeus, que foi imposto como Deus universal. É engraçado notar esse equívoco tremendo, quando colocam um deus tribal no lugar do conceito de Divindade Cósmica e chamam esse deus tribal de deus único e consideram esse arremedo de monoteísmo uma evolução, em relação ao panteísmo que sente a divindade em todas as manifestações da natureza ou ao politeísmo que cultua várias divindades.

O Budhismo tem uma perspectiva inicial diferente: Sidarta Gautama é um homem comum, como nós, que realiza o despertar e DESPERTANDO se torna o BUDHA, que quer dizer desperto. Ele não é diferente de nenhum outro ser humano e seu caminho pode ser trilhado por qualquer um. Enquanto Jesus "morre para salvar seus fiéis", mantendo antigas práticas mágicas do "cordeiro sacrificial", Gautama ensina um caminho para que qualquer um que se dedique também desperte.

Quando nos aproximamos da Wicca não vamos encontrar nenhum conceito de "salvação por procuração" fixado em um ser humano. Se notarmos com atenção a Religião da Deusa nunca desapareceu completamente. Esteve hibernando, esperando que o inverno árido espiritual que caiu sobre esta parte do mundo passasse, com toda sua terrível perseguição, principalmente às mulheres, que se dedicavam à ARTE.

Gardner tem acesso a uma antiga linhagem que sobrevive de forma discreta e pode então lançar as bases do que vai ser um "renascimento" público da Wicca e, por tabela, de várias outras formas de Paganismo (livro no link: A Bruxaria Hoje, por Gerald Gardner).

O que mais caracteriza o Paganismo em geral? A sintonia com a Natureza, o reconhecimento da divindade em cada momento da Natureza, o reconhecimento desse elo profundo e intransferível que temos para com a Natureza e a percepção que a Divindade, a Eternidade que nos envolve é feminina. Este aspecto é muito interessante e traz de volta uma questão muito séria. Não se trata de um simbolismo, não se trata, como querem alguns, que os "primitivos" consideravam a mulher um símbolo melhor para a Divindade. Aliás, é mesmo um símbolo mais rico, pois a mulher gera, assim a Deusa "emana" a criação de si, ao contrário das divindades patriarcais que precisam "criar", "modelar em argila" e outros subterfúgios mais para quem não tem útero. Não é mero símbolo, é muito mais que isso, de fato a Eternidade que nos envolve É FEMININA.

E isso não é apenas na Wicca, não. O Xamanismo em várias versões coloca isso da mesma forma. Vivemos num universo feminino e num planeta feminino. Isso não desmerece o homem e o masculino. Até pelo contrário, explica porque ficamos nesta condição de "reis da cocada preta", pois sendo uma energia mais rara na existência ganhamos uma proeminência que podia ter sido usada de forma bem mais inteligente e criativa que o criar dessa civilização doentia de valores pseudo-patriarcais na qual estamos inseridos.

Assim sendo, na Wicca não temos "avatares" de destaque que representam "guias" no caminho. Nosso contato é direto com a Deusa e suas várias faces, nosso trabalho é direto com a Fonte. Gardner e tantos outros são "expoentes" da ARTE, pessoas sérias que ao dedicarem-se ao estudo profundo da ARTE nos auxiliam a compreender melhor sua complexa simplicidade.

A Deusa tem várias faces e também é a SEM FACE, pura essência, que está em nós e em cada fenômeno e evento com o qual interagimos. Há uma tradição interessante, hoje quase perdida, que conta que na senda iniciática o(a) aprendiz começa por conhecer as 3 faces da Deusa: A Menina, a Mulher e a Anciã. As 3 fiandeiras que tecem o destino de todos. Então, quando está pronto(a) o(a) aprendiz é levado a conhecer a face escura e secreta da Deusa, sua face negra.

Após esse momento o(a) aprendiz compreende os Quatro Cantos do Mundo e seu desafio agora é ser o Quinto ponto, o centro, após conhecer as quatro faces da Deusa é momento de ser a Quinta Essência, a quinta face, manifestar a Deusa em SI. Quando realiza este quinto momento, quando sente e "É" a Deusa em si olha para Cima e para Baixo e encontra a Deusa nos Céus e na Terra que pisa. Realizou o Sexto e o Sétimo passo em seu caminho. É então que encontra o Oito, o infinito e todas as barreiras caem, descobre que todas as imagens que usava para representar a Deusa eram ainda pálidas aproximações da realidade, caem as máscaras e podemos então SENTIR a Deusa em SI mesma, em toda a plenitude de seu poder.

Se isto é realizado, estamos prontos para entrar na nona esfera de iniciação e então conhecer o Mistério além do Tempo, além do Espaço. E então voltamos a ser unidade ao lado do Zero, 10. Nós, a unidade, fortalecidos e "potencializados pela Orubós sem fim, a Deusa que nutre de si mesma, a Existência cíclica. Na Wicca, como em outros ramos profundos do Paganismo, não precisamos acreditar em avatares dos Deuses ou da Deusa, em pessoas que criaram dogmas e regras, que tem seu papel sim, no começo do caminho, para evitar confusões, mas como aquelas rodinhas que usamos para aprender a andar de bicicleta, podem virar uma dependência limitante se não temos a coragem de quando estamos prontos, tirar tais rodinhas e andar sem as mesmas, com a certeza que se não estivermos de fato prontos, o tombo vem.

Nosso elo é direto com a DEUSA e seu Consorte, com a VIDA, e a Vida só se revela sendo vivida. Qualquer teorização excessiva é sempre sinal de fuga da vida em si, real e efetiva, para ficar justificando com elaborações racionais.

Por: Nuvem que Passa em Domingo, 04 de Agosto de 2002 - 21:17:59 (Brasília)
Notas (por F. )

¹ Um dos estudos mais sérios é o trabalho da socióloga brasileira Maria Isaura Pereira Queiroz

² ver o documentário Jesus viveu na Índia, lembrando que Jesus tinha um irmão gêmeo, Tomé, o dídimo. Dídimo tem origem grega, provém do nome Didymos, que significa literalmente “gêmeo”, “nascido do mesmo parto”, de dís, o mesmo que “duas vezes”, em português.


Deusa, Paganismo e Ecologia


Realmente este texto é uma das mais belas manifestações do espírito nativo dos povos que habitavam este continente.


Quando o pretenso civilizado aqui chegou e impôs sua cultura, impôs a ferro e fogo, com morte e dor, encontrou aqui uma cultura complexa, de valores ecológicos sofisticados como bem mostra esta carta. A sintonia com a Vida e com a Terra, vista como Mãe, é algo que nós neopagãos bem entendemos. Este é o valor mais ausente desta cultura utilitarista e consumista que se instalou no mundo: Não conseguem sentir a Vida pulsando em tudo à nossa volta, perderam o elo com a Mãe Terra, ser vivo e dinâmico, com o qual podemos criar uma relação que nos permite um grau de completude, de plenitude existencial e energética inominável.

Um dos riscos que vejo na Wicca hoje é uma adoção de um culto formal à Deusa, fazendo aquilo que tantos chamam de criar um "jeová" de saias. Sem a consciência ecológica não há ligação com a Deusa. Sem a mudança dos paradigmas fundamentais nos quais fomos criados, que não são ecológicos, não levam a uma relação direta com a divindade sem intermediários e sentindo faces da divindade em cada aspecto da existência. Sem esses pontos-base não há paganismo. Sem perceber a Deusa na natureza e na vida como um todo não há paganismo efetivo. É minha opinião que os cultos a uma "personalização" da Deusa pouca relação tem com "sentir" e "celebrar" a Deusa, que sempre foi sentir e celebrar a própria vida em seus ciclos. Uma pessoa que se diz pagã e não possuí aguda, clara e intensa consciência ecológica é alguém diletante, alguém que apenas repete formas prontas, sem entender a essência. Pois como estar em um movimento que busca ser uno com a vida sem ter essa consciência ecológica plenamente desenvolvida? Este me parece o primeiro ponto.

Segundo ponto a debater é a questão de sentir a Deusa. A percepção da Deusa sem faces, da Deusa enquanto origem e fonte sempre foi um conhecimento iniciático. Pelo que pesquisei nenhum culto "popular" tinha essa concepção. Sempre neste nível mais "exotérico" o culto era a uma das faces da divindade, da Deusa. O conceito da Fonte sem Fonte, da Deusa sem face sempre esteve associado aos trabalhos já dentro dos chamados mistérios. Estes dois níveis da religiosidade antiga nunca podem ser esquecidas quando falamos sobre os cultos ancestrais, os cultos abertos ao público e portanto os únicos que deixaram registros possíveis de serem estudados pelos historiadores tinham um outro aspecto, secreto, oculto, transmitido apenas de boca para ouvido e que sobrevive até os dias de hoje dentro destas mesmas premissas, pois me parece uma das grandes ilusões contemporâneas crer que o secreto e o sagrado estão revelados. Aliás podem até estar, já que etimologicamente revelar é velar de novo. RE-velar. Mas nunca o sagrado, o segredo, os mistérios serão revelados neste sentido que dão ao termo, pois não é o mistério que pode ser aberto à compreensão limitada de quem apenas foi condicionado pela sociedade, mas somos nós que temos que nos desenvolver, sutilizar e ampliar nossa percepção para mergulhar na vastidão onde reside o secreto e o sagrado. Como a cor só se revela a alguém quando este alguém abre os olhos, não há como falar sobre cores a quem insiste em manter os olhos fechados.


O esoterismo contemporâneo, ou, melhor dizendo, o que se convencionou chamar de esoterismo hoje, é um conjunto de idéias que remete ao transcendente, mas ir ao transcendente é algo para ser feito com plenitude, jamais apenas como conceito intelectual. Da mesma forma, o paganismo é algo que hoje precisa ser recuperado. Não está em nós, criados como civilizados, de forma "natural". Por isso gosto do termo “neopagão”, fica claro que somos pessoas com toda uma influência cultural urbana, que pouco a pouco lutam para recuperar uma abordagem mais plena e realista da vida, que inclui o perceber da Vida em sua plenitude e da natureza como ser vivo e do qual fazemos parte. Por isso, lendo esta carta do chefe Seattle a gente volta a notar como são distintos e distantes os paradigmas da cultura que fomos criados e destes povos nativos.

Nossa chance é de hibridação, de fusão entre estas culturas. Quando notamos o que aconteceu de fato aos povos nativos, como foram subjugados e quase completamente destruídos percebemos que algo falhou em termos práticos, na realidade da luta pela continuidade existencial algo não foi pleno neles, pois perderam a guerra para este modelo cultural no qual fomos também limitados. Este é um dos pontos mais fundamentais quando vamos estudar o paganismo em geral. O Paganismo, embora tenha as melhores respostas para a sobrevivência efetiva da humanidade, uma vez que os modos de vida do mundo civilizado nos levam a esta crise ecológica e social sem precedentes históricos que vivemos, não conseguiu resistir à invasão, saque e genocídio, acompanhados de destruição da cultura, subjugação e imposição de um modelo cultural estranho que aconteceu onde quer que os conquistadores chegassem com seu estilo de vida. Das legiões romanas aos navegadores cristãos católicos e protestantes dos séculos XV e XVI o fato é o mesmo: destruição de povos nativos com ricas e milenares tradições seguidas da imposição de uma cultura servil aos dominadores. Portanto, há algo que os povos nativos precisavam aprender em termos reais de sobrevivência frente a grupos outros que não os seus.

O irônico é que o grupo social vencedor, até agora, nesta guerra entre nações, não é o mais apto à sobrevivência, ao contrário, apresenta mesmo um comportamento danoso e perigoso a si e a todos os outros grupos de seres vivos da Terra, pois em sua loucura e luta pelo poder constrói armas cada vez mais nefastas, já suficientes par acabar com o mundo num nível alarmante, fora as tecnologias pesadas e poluentes que adotamos em nosso cotidiano, com um total desrespeito à vida e as próximas gerações. Daí que considero que o Paganismo é revelado antes de mais nada pela prática que pelo discurso. Discursos verborrágicos, cheios de erudição não fazem de ninguém pagão. O paganismo vem da realidade prática, que pode e deve mesmo, ser embasada por um bom conhecimento da teoria do que se faz, mas é no fazer que se revela. Paganismo é atitude.

Nuvem que passa


sábado, 23 de dezembro de 2023

Cada caminhante é em última instância seu próprio caminho

Saudações Ventanias; 

Em mail anterior prometi falar um pouco sobre as origens do Xamanismo em termos históricos. O que vou narrar aqui é história como os (as) xamãs entendem história, não uma narrativa linear de eventos, mas o cerne do interesse dos (as) xamãs é algo sutil, é sobre a manifestação de uma força misteriosa, com a qual lidam todos que buscam a "alma do mundo". 

Leio muitos mails, dos mais diversos, diariamente. Mais jornais e livros e conversas com pessoas e cursos, dá para ir formando uma ideia de como é o "senso comum " da realidade. As pessoas do mundo "comum" foram condicionadas a uma percepção da realidade, por um conjunto de condições históricas que culminou na revolução industrial. Com a ocorrência da revolução industrial há uma produção de manufaturados em larga escala, uma necessidade de matéria prima também em grande quantidade, uma necessidade de que pessoas comprem o que está sendo produzido, enfim, as necessidades da revolução industrial criou toda uma era, a Era Industrial. 

Estudiosos como Toffler, Domenico de Masi, Giovanni Vismara, A. Touraine, Gershuny e tantos outros(as) já falam sobre o fim da Era Industrial e a transição que estamos vivendo para outra Era, outra "Onda " no dizer de Toffler. A revolução industrial, entretanto, ainda representa um conjunto de valores que dominam muitos setores da sociedade, inclusive a mídia e algo que tem poder sobre a mídia tem o poder de vender a própria imagem como quer. Esse poder da mídia é um tipo de magia moderna que muitas vezes passa despercebida.

 Existem pessoas que sabem usar do poder da mídia para criarem frente ao mundo uma imagem, isso é magia, criar, gerar algo por intenção. Este poder da mídia associado a religião, escola e educação familiar são vetores eficientes de conceitos e paradigmas da era industrial. Cada um desses conceitos e paradigmas são limites a nossa percepção. E são esses limites perceptivos que precisam ser investigados e compreendidos para que possamos não apenas deixá-los de lado por um tempo, mas realmente nos tornarmos entes perceptivos e singulares, gerados a partir de nós mesmos, de nosso cerne silencioso, intocado por qualquer programação exterior. Dessa forma vem a memória um dos conceitos importantes sobre xamanismo que o velho nagual apresentou ao novo, no mito tolteca atual: " Não é que a medida que o tempo passa o(a) guerreiro(a) aprenda Xamanismo; antes, o que ele aprende enquanto o tempo passa é economizar energia . Esta energia vai capacitá-lo a manipular alguns campos de energia que são normalmente inacessíveis a ele. Xamanismo é um estado de consciência , a capacidade de usar campos de energia que não são empregados para perceber o mundo cotidiano que conhecemos" (de "O Poder do Silêncio" citado no "A Roda do Tempo". 

Este conceito é de uma sutileza e abrangência fenomenais, a capacidade de exprimir em sintaxe comum tais conceitos revela uma maestria das palavras que é bem mais que a expressão entre dois seres perceptivos e conscientes, mas algo mais mesmo, algo relativo a essa estranha "Força" que permeia a Realidade mais ampla , na qual estamos inseridos, como uma camada em vasta cebola. O Xamanismo tem sido sempre isto, ir mais longe, ir além, ser mais amplo, ampliar a consciência. Os meios que podem ser utilizados são vários e 

cada caminhante é em última instância seu próprio caminho.

Dentro desta proposta o Xamanismo é a herança que temos de uma civilização anterior que existiu num outro tempo e outro espaço, mas que nos antecedeu. Os clãs de vários lugares tem história sobre um mundo anterior a esse, o quarto mundo de onde nossos antepassados vieram depois que tal mundo foi destruído. Há muitas histórias que tentaram com armas, doutrinas, pregações, medo, culpa e dor apagar de nossa memória. 

Mas o tempo mítico está voltando, as emanações de Hunab Ku voltam a incidir sobre nosso plano da realidade. Estávamos como que em um eclipse, em relação a Hunaby Kü, agora outro tipo de energia começa a incidir sobre nós. Nós sabemos disso, mas os Senhores e Senhoras Feudais atuais também sabem e seus feiticeiros de aluguel estão cuidando , através de meios com títulos sofisticados como "engenharia religiosa", " engenharia e gestão de comportamento de massas" entre outros, desenvolver linhas de ações por todo o planeta para evitar que no momento da grande transição, em "aproximadamente" 23 de Dezembro de 2012 façamos a conexão com o vasto poder que vai estar, como uma nuvem, passando por aqui. Se esta conexão for feita estamos reconectados com o Centro Galáctico, com a vasta energia que de lá emana e teremos entrado noutras possibilidades realizadoras em termos efetivos e concretos, no TONAL da Realidade. 

Mas as possibilidades que se abrem no outro campo é também imensa, pois sabemos que o campo adequado para se "treinar" no Nagual é o campo análogo ao tamanho do poder do Tonal sobre a realidade. O velho nagual mostrou isso ao grupo do México levando-os em excursão para um vale distante e lá colocando uma mesa com objetos em cima e usando tal mesa para demonstrar o Tonal, frente a vastidão do Nagual, quando foram a uma montanha longe olhar a mesa, imperceptível, no meio do vasto vale. Recomendam os Naguais da linhagem Tolteca que não nos percamos tolamente no mundo do Nagual, ou seja, em todas as outras realidades alternativas a essa que realmente existem. Este é um detalhe muito sutil no Xamanismo. 

Xamanismo é simplesmente usar o corpo esquerdo para perceber a realidade de forma funcional e ampliar a capacidade do corpo direito para o mesmo fim. Agora a nossa "personalidade", nossa estrutura psíquica frente a tudo isso que podemos fazer é algo que pode ou não ser cultivado. Podemos nos trabalhar, aprender a lidar e ir além das carências e medos, fantasias e culpas que o sistema criou como travas para impedir nossa liberdade por isso o Xamanismo Guerreiro não começa com "caçar animal de poder" ou ir a outros mundos e tudo mais que pode ser sim feito e deve, depois. 

Primeiro é preciso trabalhar o aqui e agora, pois tenho tido cada vez mais certeza na minha experiência pessoal que toda pessoa que consegue se realizar aqui e agora, que consegue lidar com o imanente está pronta para a aventura e o desafio que é suportar a pressão do desconhecido, já quem vive sempre fugindo em universos fantasiosos e explicações rebuscadas de sua preguiça em lidar com o aqui e agora, sempre criam problemas, confusões e acabam cedendo as pressões do infinito se tornando seguidores de algum sistema ou seres, não livres viajantes pela eternidade, que é como concebo o Xamanismo. 

Alguns temas para meditar.

Nuvem que Passa

Data: Ter Dez 26, 2000 6:04 pm

Assunto: Re: [ventania] Natal e Calendários

 

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Ritos de Passagem

A civilização na qual estamos inseridos tem algumas falhas estruturais no quesito levar cada ser humano ao atingir de sua maturidade moral e intelectual.

A grande maioria dos seres humanos é levada a viver num estado que nem mesmo imaturo podemos chamar, pois é tal a anulação das vontades individuais, tal a inexistência de propósitos gerados a partir da singularidade que somos, é tão rara a nossa presença no aqui e agora, tal nossa dissolução em passados frustrados ou futuros ansiosos, que chamar de imaturo este estado é muito, pois máquinas robotizadas e hipnotizadas nem mesmo imaturas são.

Os seres humanos foram tornados peças de uma vasta engrenagem, onde atuam como extensão biológica das máquinas diversas, geradas para manter o poder de poucos sobre muitos.

A liberdade fundamental acessível aos seres humanos, a liberdade de realizar sua singularidade existencial é negada aos seres humanos de formas diversas e agora, com o poder tecnológico existente, está sendo negada a outras espécies, com a crescente ação destruidora sobre o meio que esta civilização realiza.

Experimentem observar mapas de vegetação em várias áreas do mundo e observar como a destruição das matas nativas aumenta neste último ciclo, chamado de Era Industrial.

Notem o exemplo da Mata Atlântica.

Os animais extintos, agora enquanto escrevo estas linhas, mais tarde, nos vários tempos e espaços que estas linhas estarão sendo lidas, extinção de espécies poderão estar acontecendo.

Procure sentir o mundo a sua volta, não apenas racionalizar sobre ele, mas sentir.

Quando estamos sensíveis a Natureza percebemos que ela tem ciclos, que as flores e os frutos, as folhas em certas árvores, vem e vão, num ciclo.

Há momentos que marcam essas mudanças.

Nos equinócios e solstícios sabemos que um ciclo atingiu seu apogeu e depois ele irá visitar sua outra condição, como no Tao quando o Yin chega ao seu máximo mergulha na semente do Yang que traz em si, da qual também brotará quando o Yang atingir seu clímax.

Sabemos que após o solstício de inverno o frio chegou ao limite, a noite mais longa do ano depois começa de novo a volta da luz solar.

Para nós neste país tropical é bem mais a luminosidade que nos toca, mas em países mais afastados do equador o calor também é algo que fica bem claro em sua volta.

No equinócio o dia e a noite ficam iguais, o momento de equilíbrio, é a primavera chegando depois do inverno.

Noto que em grande parte da região sul e sudeste do Brasil a chegada da primavera é principalmente a chegada das águas, mais que a ausência de frio, que marca a volta da Vida.

Notem que este dado é de grande importância para estudarmos os ritos de passagem.

Onde estamos, nos nossos ciclos naturais, a Terra, o Ser consciente no qual vivemos, sente a volta da primavera como a volta da umidade, que alimenta e o calor desperta a semente que dorme no seio da Terra.

Então, dia após dia, a claridade chega mais cedo e vai embora mais tarde.

Os dias são maiores.

Os tuns, como chamavam os Maias cada ciclo do nascer ao pôr do sol.

Sinto que o dia se abre com o sol nascendo e se fecha ao pôr do Sol.

Sentir durante o dia o caminho do Sol é uma prática que aumenta muito nossa energia existencial.

Somos o amálgama do poder do Sol e da Terra em nosso corpo sensível.

Assim como o corpo de energia é feito em primeira estância com matéria oriunda das emanações dos astros, por isso corpo ASTRAL na literatura de certas escolas alquímicas e mágicas.

O tema foi depois adulterado, ficando astral para um nível, um orbital do todo que é o corpo de energia.

A ideia de sete corpos e sete planos da Teosofia, em sua versão original era de uma sutileza ímpar.

Depois se tornou adulterada, quando passou a ser lida dentro de paradigmas estranhos a sua essência, oriundos desta civilização que linhas atrás citávamos como robotizante e limitante do nosso potencial perceptivo.

Portanto para meditarmos sobre ritos de passagem precisamos evocar a ideia de passagem, de transformações, como estávamos fazendo agora, tecendo comentários sobre os ciclos.

Nossa vida também é marcada por ciclos.

Temos ciclos nos quais estamos diluídos na existência e pouco a pouco vamos adquirindo uma singularidade, que pode brotar de nosso próprio interior ou ser apenas resultado da programação exercida pelo meio.

Os ritos de passagem eram uma forma que várias civilizações usavam para marcar certos momentos de profunda transformação na jornada de um ser humano.

Homens e mulheres tem uma longa trilha até atingirem a completude de seus seres.

A lagarta brota do ovo, recolhe-se no casulo e então surge borboleta.

Profunda em si, plena, a tensão sutil do casulo fortalece as asas que dele brotam.

Também nós brotamos de nós mesmos várias vezes numa vida, mas pouco disso percebemos, pois faz parte do aparato que restringe a percepção humana prender todos (as) numa abordagem linear da realidade.

A complexidade da vida quando deixamos de ter uma participação linear e nos tornamos coparticipativos, cocriativos frente a realidade com a qual interagimos dinamicamente.

Esta forma de lidar com o mundo muda nosso senso de identidade.

Deixamos de nos identificar com os modelos prontos que nos deram para interpretar a realidade.

Podemos usar esses modelos prontos, a dita cuja realidade e nela treinarmos nossas habilidades fundamentais.

Assim usando a realidade na qual já estamos "travados" como campo de treino no desenvolver de uma atenção plena, de um estar aqui e agora sem nenhum medo ou culpa, no presente, inteiros (as), sentindo a música da vida, dançando a dança do existir, a Eternidade por parceira.

Celebrar os momentos nos quais nos transformamos é uma forma de fortalecer os momentos nos quais agimos com foco, consciência, presença no aqui e agora, num aqui e agora que marcou uma alteração profunda na forma de interagir com a realidade.

Os ritos de passagem entram nessa categoria de celebração que nada adoram, nada suplicam, nada "dominam".

Os ritos de passagem são momentos de celebração, de uma fase que se vai, de uma vitória existencial e de uma fase que se inicia, um desafio existencial.

E num estado de espírito de harmonia com a fase que se foi, um desgrudar-se de toda e qualquer energia que os eventos e pessoas envolvidos nesta fase podem ter deixado em ti, recuperar toda a tua própria energia que ficou dissipada em pessoas e eventos e com integridade seguir em frente, rumo ao desafio.

Celebrar esses ritos é afinar a consciência individual com a totalidade da qual faz parte, mas ressaltando também sua singularidade.

A questão de sermos singularidades, imersas e túrgidas da Eternidade que nos faz existir e ainda assim, singulares.

A pretensa singularidade do conceito de "eu" hoje vigente é uma singularidade apartada da Vida e da Natureza, o que gera seres sem visão sistêmica, capazes de levar a Vida ao desequilíbrio e ameaça de destruição total que é realidade pouco percebida pelos(as) hipnotizados(as) que se chamam civilizados(as).

A singularidade a qual me refiro é outra, é uma singularidade que se sabe existente, uma percepção que tem consciência de si como ente perceptivo.

Assim sendo, como um ente perceptivo, um núcleo partícula/onda de percepção pura pode de alguma forma crer-se apartado de qualquer coisa que seja que está a sua volta.

Sensível, ressonante, quando estamos neste eixo, que como o da roda da carroça se revela em cada ponto do aro da roda que toca no solo.

O caminho rumo ao despertar, desabrochar e o entrar em plena atividade destas dimensões outras de nossa realidade interior, a qual tivemos por esta era que se finda, o acesso negado é um caminho árduo, mas não sofrido, como um artista ou atleta dedica-se com afinco, sem sofrer com isso, pois o fato de ter metas faz de quem trilha um caminho, um treino e não algo que lhe acontece apenas agitando uma paranoica vida de ansiedades.

Os ritos de passagem surgem como ritos que reatualizam o mito, pois viver miticamente sua própria existência é algo que nos coloca sobre efeito de leis bem mais amplas e interessantes que as geradas por sistemas que buscaram pelos últimos séculos apenas dominar, subjugar, converter e escravizar.

Nossos sistemas "oficiais" de pensar e sentir a realidade estão impregnados dessas travas, que limitam e condicionam as pessoas a serem menos que elas mesmas, a não mais fazer história, apenas sofrer a história.

Um novo pensar, um novo sentir é o que urge desenvolver não só no organismo coletivo da humanidade como, antes de mais nada e como caminho para tal meta, em nós mesmos.

Os ritos de passagem apresentam outra forma de lidar com nossa vida.

Ao invés de ficarmos contando anos, obedecendo calendários propositadamente deturpados, podemos sentir o fluxo da Vida de uma forma mais ampla e real em nossa existência.

Os ritos de passagem fazem parte dos paradigmas fundamentais dos povos que estiveram como guardiães desta antiga sabedoria, de ancestral cultura global que existiu, que soçobrou há inexatos 10.000 anos atrás.

Sempre lembrando que este conceito de tempo tem mais da sua fantasia e imaginação que de realidade quando o interpreta.

Vou enviar uma sequência de mails sobre esta questão dos ritos de passagem para meditarmos em conjunto sobre o Tema.

Nuvem que passa
Data: Dom Out 8, 2000 7:47 pm

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

A Obra do Nagual, por Nuvem que passa


"A obra de Carlos Castañeda poder ser considerada como uma das obras mais interessantes e revolucionárias de nosso século. Ali conceitos completamente novos são apresentados, abordagens realmente novas da realidade e da nossa percepção das mesmas, são apresentadas lado a lado com conhecimentos similares a encontrados no Taoismo, certas linhas de budhismo, islamismo, hinduismo, cristianismo, judaísmo chamadas de "esotéricas". 

Existe um livro que tenta provar que Castaneda não viveu nenhuma das experiências que narra, o background espaço temporal que ele usa como contexto para expor os conhecimentos ali liberados pela primeira vez fora dos fechadíssimos, discretos e ciosos grupos que exploram há milênios esse mesmo saber. 

Para alguém que ensina a ausência de história pessoal nada mais coerente que ter um livro publicado por um estudioso sério desmentindo o fundo "pessoal" dos conhecimentos apresentados.

O Doutor Carlos Castañeda tenta mostrar ser a América possuidora de civilizações tão complexas como as que deixaram seus sinais em outras partes do Globo. Perguntas fundamentais que resultaram como resposta à Arte, à Magia ou à Ciência oficial, em outras partes do mundo, aqui geraram formas de magia e ciência muito complexas e a dizimação quase completa dos povos nativos, ainda em curso, diga-se de passagem, não quebrou esse elo de transmissão.

Uma leitura atenta dos 3 primeiros livros nos quais este relato é mais intenso, revela que as informações chave, como os 4 inimigos daquele(a) que busca o conhecimento, tem valor intrínseco, independente do contexto em que foram apresentadas. O valor do conhecimento expresso vai muito além do contexto onde ele está inserido. Se o Doutor Carlos Castañeda estava aprendendo com o velho índio no deserto mexicano ou no parque de sua cidade ou em seu quintal em Los Angeles não é este o ponto focal. 

Mas o que me interessa bastante é que numa era de paparazzis que são de uma forma ou de outra, corresponsáveis pela morte de uma princesa do Império Britânico, num mundo onde ninguém passa totalmente despercebido, num mundo cheio de recursos, alguém que passou os últimos anos de sua vida dando seminários para mais de 300 pessoas em cada um deles, nos EUA e na Europa, não tenha mais que algumas poucas e contraditórias fotos suas. Nesta era de total invasão da privacidade em nome dessa imprensa marrom que sustenta o esporte preferido, mexericos, desde que os hábitos das cortes parecem ter contaminado nossas vidas, nesta era da imagem, quase nenhuma foto.

E depois que ele "morreu" de câncer de fígado, como Krishnamurti antes dele, em prometeica herança, o seu livro, mais vendido por meses, foi um livro chamado "Passes Mágicos" - Um livro de posturas de poder, em fotos, para longevidade e bem estar, saúde e harmonia. 

Contradição, paradoxo, os que leem Castañeda são birutas mesmo, derreteram o cérebro brincando com plantas de poder? 

O que sinto após tornar a ler a obra inteira de uma vez em duas semanas, é que estamos diante de um tratado, algo que supera grande parte dos tratados de magia escrito no século passado, embora integre harmonicamente os conceitos apresentados por muitas escolas competentes. 

De alguma forma, nunca saberemos exatamente como, C. C., também conhecido como Joe, ou como Isidoro Baltazar ou outros nomes, entrou em contato com um saber ancestral. Por anos ele conviveu com homens e mulheres que eram herdeiros diretos desse saber. 

Ponto um: nenhum desses homens ou mulheres tinham a menor intenção de criar uma seita, uma religião ou fazer proselitismo de seu saber. Eles estavam apenas perpetuando uma linhagem. Estavam dando continuidade a uma magia antiga, a uma linhagem de poder e ser que começara em tempo indeterminado, na Era mítica. Cada um desses homens e mulheres afirmaram que só como mito poder-se-ia viver plenamente o caminho que eles apontavam ao relutante aprendiz. E por ser relutante, por ser difícil ele era bastante apreciado. Num caminho onde voluntários são vistos com reservas, pois voluntários costumam acreditar que sabem o que estão procurando e deturpam o conhecimento para adaptar-se a seus padrões preconcebidos. Pois para aqueles homens e mulheres, ao menos foram homens e mulheres um dia, voluntários raramente eram bem-vindos. Voluntários têm ideias muito preconcebidas e raramente aceitam mudar realmente, não aceitam a morte que toda iniciação propõe. 

E aprendendo de uma forma muito complexa começou Carlos Castañeda a aprender com aquele grupo. E nesse aprendizado se viu ludibriado várias vezes pelo velho índio que era estranhamente inteligente e sofisticado, coisas que o preconceito acadêmico raramente permite a um "nativo". Ludibriado, pois enquanto sua atenção estava fixa em algum aspecto que lhe era colocado a frente, a verdadeira ação de D. Juan Matus, também conhecido como John Michael Abelar e Mariano Aureliano, entre outros, enquanto o verdadeiro aprendizado acontecia disfarçadamente, evitando que sua mente racional e condicionada lutasse contra tal saber, deixando que ele sedimentasse como ganho efetivo. Aprendizado complexo, pois lidava também com um outro estado de consciência que antes dele nenhuma escola esotérica explicitou com tanta clareza. Todos sabemos que estar dentro de uma escola, estar ligado a um mestre ou mestra cria uma atmosfera psíquica própria, a energia de quem ensina, quando é real, permite um catalisar do processo de aprendizagem, baixa a energia de ativação necessária para se alcançar certos resultados. 

O método proposto pela escola Tolteca é muito sutil. Num nível alterado de consciência, num nível específico, onde a lembrança do dia a dia fica mais fraca, um nível que não é lembrado no dia a dia, neste nível ocorre outra parte do treinamento do aprendiz. Aqui ele recebe conhecimentos de grande poder, conhecimentos que estarão protegidos pelo esquecimento até que o aprendiz tenha energia suficiente para acessar tal nível por si. Por isso ler a obra de C.C. implica em compreender que tudo que é apresentado tem uma complexidade muito maior. 

C.C. começa seu caminho público quando aparece na mídia e vira guru alternativo, padrinho da nova Era, pela exaltação dos alucinógenos¹ como caminho para se tornar "um homem de conhecimento". Quando chega em Viagem a Ixtlan ele muda suas colocações revelando que os aspectos mais importantes do saber que estava recebendo não eram de forma alguma as viagens que tivera sob efeito das plantas de poder. 

E coloca que partes que havia anotado e deixado de lado se revelavam agora a espinha dorsal do sistema que começava a vislumbrar atrás dos atos aparentemente malucos de seu informante índio. Um velho que, exceto por um companheiro ainda mais louco, D. Genaro, que representava ser realmente demente e capaz de fazer coisas que estarreciam a mente linear, parecia viver isolado e fora do mundo em algum ponto do México, na região de Sonora. 

Quando C.C. lançou Viagem a Ixtlan, seu trabalho de mestrado, obteve uma resposta diferente da mídia.  Pouco a pouco os meios de comunicação passaram a desgostar de sua mensagem, o governo mexicano, conhecido por uma política sistemática de extermínio dos povos nativos, ainda hoje em andamento, vide Chiapas, ficou preocupado. Os povos nativos de todo o continente pela primeira vez tinham suas reais tradições trazidas à tona, quando digo reais digo suas tradições esotéricas, não o arremedo exterior que ficou reproduzido pelos sobreviventes, exilados de si mesmos, como os africanos vieram exilados de sua terra. E neste continente, por estarem exilados de si mesmos, não puderam levar nada, nada sobrou e o mito da puerilidade dos ritos e crenças dos nativos dessas terras ganhou força. 

Mas um grupo continuou ensinando seu aprendiz sem se ocupar disso. Escrever os livros era uma tarefa que C.C. recebera de seu mestre iniciador e cumpri-la era sua missão. Viagem a Ixtlan é um livro de acesso ao Xamanismo Guerreiro. E é importante notar que estamos falando de Xamanismo Guerreiro. O Xamanismo que sobreviveu graças aos iniciados dos clãs guerreiros que sobreviveram aos massacres, primeiro de outras tribos em guerras várias, como os Astecas já um século antes da Conquista, depois dos invasores de além do oceano, que vinham para dizimar e apagar da história da ancestral civilização que se manifestava em muitas formas por todo o continente. 

O fato é que aquele grupo vem da linhagem guerreira, por isso nada mais ilusório que querer fazer proselitismo das ideias de Carlos Castañeda. A obra é o relato de uma linhagem, um partilhar de conhecimentos úteis a quem segue um determinado caminho. Como todo caminho rumo ao despertar tem muitas ideias que servem a todos que desejam uma vida mais plena e forte, mas as nuances mais importantes do processo são algo específico para quem busca o despertar na forma que os(as) xamãs guerreiros(as) consideram a mais adequada para se tornar um ser pleno quando adentrarmos outros mundos. Entrar em outros mundos, atingir outros estados de consciência com autonomia e liberdade, não como servos de criaturas ancestrais que já vivem nessas outras esferas e tem a terrível mania de nos tomar sob sua tutela, a um pesado preço: nossa liberdade. 

É nesse contexto que C.C. aprende e certo dia caminhando numa cidade do interior do México tem outro "assalto a sua razão". O caipira, o índio eremita estava na cidade grande, de terno e gravata, meias combinando como D. Juan mesmo chama a atenção. E começa uma nova fase do aprendizado. Um conceito complexo é apresentado: Tonal e Nagual. E a obra ganha nova profundidade, conhecimentos complexos são apresentados e o inusitado também entra em cena. D. Juan Matus e D. Genaro desaparecem. 

Antes disso criam um drama iniciático catártico e como ato final Carlos Castaneda vai pular num precipício voluntariamente junto com outros aprendizes, corroborando em si e por si, os ensinamentos que havia recebido. O interessante é que em toda a história subsequente a trajetória iniciática fica mais forte e os conhecimentos que acompanham a narrativa são dos mais interessantes. Carlos Castaneda justifica a publicação de sua obra como resultado de um "acidente". D. Juan quando o encontrou pensou que ele, C.C., fosse um nagual, um homem dividido, alguém com um tipo de energia suficientemente elaborada para não apenas aprender a complexa arte da magia tolteca mas também ser um guia de um grupo de xamãs.

No Xamanismo Tolteca não há mestres, gurus ou nada disso, existem apenas homens e mulheres que têm suas posições no grupo, de acordo com seus "ventos" ou conformações energéticas. O líder do grupo é um homem ou mulher que tenha uma energia extra, chamados de Naguais. Um homem ou mulher nagual, graças a sua energia extra pode ajudar o grupo a ir além da vastidão da Eternidade, rumo aos reais objetivos dos "Nuevos Videntes": Liberdade Total! Mas com o passar do tempo descobriu que C.C.não tinha energia para continuar a linhagem². Daí que C.C. e suas companheiras, só citadas nos últimos livros, resolvem publicar relatos de toda sua busca e uma parte dos ensinamentos recebidos, já que fechavam a porta dessa linhagem e não queriam que tal saber simplesmente deixasse esse mundo. Se isto é exato, se de fato ocorreu assim ou é apenas uma esperta manobra do espreitador C.C. para apresentar sua obra ao mundo e escapar da condição de messias e guru que ainda assim lhe foi imputada, fica em segundo plano. O fato é que tivemos acesso a essa linhagem de conhecimento que apresenta conceitos complexos e diferentes, ancestrais em sua origem, originais em sua forma de colocar. 

A obra do nagual - parte 2

O Nagualismo trazido ao nosso conhecimento pela obra do antropólogo doutor Carlos Castaneda apresenta temas dos mais interessantes. 

C.C. após passar por experiências intensas, como o ataque que sofreu nas mãos da feiticeira Soledad, que poderia tê-lo matado, começa a resgatar outra dimensão do seu aprendizado, que havia estado guardada em outra frequência de seu ser. Como se fosse um aparelho de rádio, C.C. descobre que além das ondas AM onde vive, mundo que chama de real, há outro mundo operando em ondas de FM. Ele vai percebendo, a princípio desordenadamente depois, pouco a pouco com mais coerência que tudo que pensava compreender de seu treinamento é apenas a ponta de um iceberg de algo muito mais complexo. 

Começo por aqui este tema para deixar claro que a obra do Doutor Carlos Castañeda não pode ser lida pela metade. Só a leitura completa da obra , todos os volumes, permitem uma abordagem mais adequada do que ele pretende transmitir. Ele esteve exposto a magistrais manipuladores dos estados de consciência que um ser humano pode alcançar e cuidaram para que a parte mais profunda e complexa de seu aprendizado acontecesse neste outro nível, em FM.

Com o auxílio de "La Gorda" ele relembra fragmentos deste mundo paralelo no qual esteve vivendo, essa vida paralela onde aprendia com todo o "grupo do Nagual" composto por 16 pessoas, cada uma depositária de um aspecto do antigo saber Tolteca, herdado e mantido por todos esses milhares de anos, bem nas barbas da orgulhosa e prepotente civilização que pretendia escravizar corpos e almas para seus fins. Cada um dos 16 integrantes do grupo era expert num aspecto do saber dos antigos Toltecas, eram elementos vivos e dinâmicos de um mito, de uma tradição. Isto é um ponto dos mais importantes para quem estuda o caminho Tolteca. Ele não pode ser criado como nós entendemos criação, ele não pode ser forjado em nossas frágeis forjas. 

Embora a herança dos Toltecas, a Liberdade Total, possa ser requerida por muitos, embora não seja necessário estar num grupo nagualístico para reivindicar acesso a herança Tolteca, um grupo Tolteca tradicional está dentro de parâmetros próprios, não aleatórios e não acessíveis a uma manipulação artificial. Embora os conquistadores houvessem tentado exterminar a antiga tradição eles falharam. Os quatro ventos, as quatro direções do mundo, os quatro pilares, enfim, o cerne do poder dos antigos nativos permanecia (e permanece), sendo transmitido em palavras e atos de poder. 

C.C. se lembra de como foi apresentado a cada uma dessas pessoas, como foi testado e trabalhado para abandonar seu falso eu, essa multidão criada pelo Sistema. Abandonar o que acreditava ser para de fato mergulhar na essência perceptiva que era e que poderia desenvolver a tal ponto que poderia ao final, transcender o apelo de morrer e entrar num estado alternativo de continuidade. 

D. Juan Matus, Genaro, Silvio Manuel, Vicente. 

Quatro homens que herdam aspectos do saber Tolteca e o ensinam a C.C. Silvio Manoel, mestre do Intento, poderoso e assustador feiticeiro no princípio para o ainda imaturo C.C. mas que vai se revelar um excelente dançarino, verdadeiro pé de valsa que ensina as companheiras de C.C., já de um grupo diferente do que é citado nos livros até então, a dançarem "a dança do intento", onde(no qual) os passes mágicos da Tensegridade, exercícios de movimento para liberar e fluir a energia em nós, são associados a dança gerando movimentos de grande poder. 

O mundo onde C.C. se vê inserido é complexo e não podemos querer encontrar aí uma textura comum a nossa "realidade" pois, embora material, este mundo está noutra camada da cebola, muito perto desta, é verdade, mas ainda assim distinto. Os conceitos que C.C. recebe de seus iniciadores e iniciadoras vem da ancestral civilização que existiu na região onde hoje estende-se o estado mexicano e algumas outras republicas sulamericanas, mais um pedaço que hoje está nas mãos dos EUA. Esta civilização atingiu seu ápice em algum momento que situa-se há aproximadamente 4000 anos de nosso tempo. Então, algo ocorreu e eles e elas se foram, para alhures. 

Os que ficaram reorganizaram o que restou desse saber e surgiu um segundo ciclo civilizatório com o saber herdado, uma Era de Prata, se chamarmos a Era do auge deste poder de Era de Ouro. Mas então chegaram os primeiros povos conquistadores. Outros povos nativos que vinham com algo diferente em sua mente. Eles só captavam AM não eram mais capazes de sintonizar em FM. Este limite era também uma proteção. Quando poderosos feiticeiros convocavam seus "aliados" e "animais de poder" muitas vezes nada conseguiam, apenas uma flechada ou bordunada e eram mortos. Muitos foram mortos e a civilização mágica caiu. Alguns poucos sobreviveram e em seu refúgio começaram a estudar porque eles haviam conseguido sobreviver e outros não. Por que a magia deles funcionara e a de tantos outros não. 

A primeira coisa que descobriram é que o que consideravam ser o plano "espiritual", um plano superior e mais forte que este era na realidade outra face da moeda, mais vasto é verdade, mas não superior. E que a maioria dos sobreviventes era do clã guerreiro, que ainda se dedicava às práticas físicas e aos trabalhos corporais, revelando que o poder a mais que tinham, o fator determinante para a sua sobrevivência, foi o poder do corpo. 

Este ponto foi fundamental para seus novos estudos, começaram a trabalhar algumas questões antigas e descobriram que resolver este mundo antes de mergulhar na eternidade é gerar condições de energia para evitar se diluir na amplitude da eternidade. Aí começaram um novo caminho, com uma profunda crítica aos hábitos de seus antepassados,  que não foram suficientes para mantê-los vivos, algo fundamental. Quando estavam no auge desse processo, duzentos anos aproximadamente após a queda de uma porção significativa das aldeias ainda resistentes ao domínio dos Astecas chegaram os invasores iberos, estes sim bárbaros e tirânicos. Sob esta condição de profunda opressão os sobreviventes forjaram seu conhecimento, exigente, disciplinado, guerreiro.

Data: Ter Mai 2, 2000 8:27 am

A Obra do nagual 3

A partir de agora o texto só vai interessar ou mesmo ser realmente compreendido aos que estudam a obra do novo nagual. O trabalho que C.C. tem em sistematizar a experiência pela qual passou e colocá-la em palavras é em si mesmo uma das mais complexas abordagens antropológicas de uma civilização em tudo e por tudo alienígena à atual. 

Culturalmente alienígena, vejam bem. 

C.C. se torna praticante, mas não deixa de ser um homem racional do ocidente, que busca explicar, que busca sistematizar o saber que lhe está sendo apresentado. Ele aplica as ferramentas cognitivas e os novos modelos de realidade que lhe são demonstrados junto com a nova "descrição de mundo" que lhe é apresentada nas questões mais fortes de nosso tempo e traz uma sutileza de abordagem da realidade na qual estamos inseridos, que distingue sua obra. 

Ele mostra que tudo é Trabalho, que nada vem de graça (Nada neste mundo é um presente. O que tiver de ser aprendido será aprendido da maneira mais dura, em Roda do Tempo, de Carlos Castaneda.). Vai concordar com Gurdjieff e outros que já haviam dito que os planos da Eternidade para o ser humano nada tem que o permita se considerar "eleito", "favorecido". O ser humano tem uma função cósmica. Ao nascer ganha a consciência. Durante a vida desenvolve e matura essa consciência. Para ao final, a força motriz e original da existência, chamada Águia ou mar escuro da consciência, receba de volta essa consciência enriquecida, imediatamente após a morte ou algum tempo depois, pois a consciência pode sobreviver em várias formas nos muitos mundos que existem paralelos a esse. 

O forte das descobertas dos Toltecas é que existe um caminho alternativo. Que existe uma chance que é apresentada de tal forma que não vamos ler abordagem equivalente em nenhuma outra obra apresentada no ocidente como reveladora da sabedoria ancestral. 

O ser humano pode, a partir de certas práticas, no decorrer de sua vida, escapar dessa dissolução e entrar num estado alternativo de consciência que é quase uma eternidade, embora ainda aqui, fique claro que há um limite. 

Esta abordagem muda toda uma concepção muito em voga nos meios esotéricos. Vidas após vidas para evoluir, para chegar a algum lugar. 

O Xamanismo Guerreiro dos Toltecas afasta toda essa ideia e coloca essa vida como única, como a mais importante e o campo onde a batalha contra nossos oponentes devem ser travadas. 

Quem são esses oponentes? 

Demônios, seres perigosos de outros mundos? 

Os mais perigosos estão em nós, são eles que podem abrir a porta da fortaleza quando o exterior tenta atacar. Se eles forem vencidos, os exteriores perdem seu poder. Aos que buscam o conhecimento quatro já foram apresentados: 

O medo, que paralisa, a clareza que cega, que gera a arrogância de tudo saber, esquecendo que num mundo em expansão o aprendizado é constante, o poder que fascina e aprisiona criando marionetes que se julgam entes poderosos quando na realidade servem os que julgam dominar e a velhice, compreendida como a incapacidade de pôr em atos o que sabemos

São inimigos constantes, nunca totalmente vencidos, sempre prontos a voltar e tomar o controle da situação. 

A importância pessoal é apontada como sua principal arma. 

Há uma estratégia fundamental nesta luta: Desmontar as rotinas da vida, para estar atento a cada momento, sem entrar no "piloto automático". 

Apagar pouco a pouco a história pessoal. 

Essas são as práticas mágicas ensinadas ao aprendiz. E embora pareçam a alguns tolas, quem ousa realizá-las compreenderá que esteve tecendo sua capa mágica, que esteve forjando sua arma mágica, que se chamará Implacabilidade e também esteve trabalhando seu escudo, a ausência de importância pessoal, que tem sua chave na ausência de piedade por si mesmo.

Quando a estratégia da ação abrange o ser implacável, paciente, astuto e gentil, sabe o aprendiz que chegou num ponto decisivo. 

Sua energia acumulada expulsa sua percepção da condição "normal" que até então era mantida. 

Surge um desassossego.

O mundo não é o mesmo, não é mais satisfatório, há algo que te chama além. O chamado do infinito tem vários nomes em cada cultura , mas o fato é que quem já o ouviu nunca mais irá ficar tranquilo se ceder a mediocridade de uma vida conformada ao cotidiano. 

O chamado do infinito tem a estranha habilidade de despertar em nós um senso crítico interior que sempre nos dirá, quer queiramos saber ou não, se continuamos fazendo do dom da vida um caminho para a liberdade ou se voltamos e cedemos e nos vendemos por algum preço ou conforto, ao sistema, à "Matrix".

C.C. percebe que foi isso que aprendeu e aprende que seu campo de batalha era o mundo das cidades, os lugares onde ia, onde estudava, era ali que deveria aprender a aplicar tudo que aprendeu e atingir a condição singular, onde tudo que havia herdado lhe ajudaria a ser ele mesmo, um evento conectado ao infinito, mas único. 

Como um vetor resultante que subitamente deixa de ser apenas o resultado de todas as forças exercidas sobre o móvel, mas se torna uma força ele mesmo, uma força nascida de si mesmo, uma vontade plena. 

C.C. experimenta muitas possibilidades de aglutinar mundos. Vai a muitos lugares diferentes e explora o mistério do ponto de aglutinação, conhecimento de um ineditismo ímpar. Não há conceito similar a esse em outras obras e cito isso aqui para que todos percebam que estamos diante de um conceito "novo", algo raro nessa era de reedições e releituras. 

O ponto de aglutinação será nosso próximo tema.

Nuvem que Passa

Notas

¹ O termo alucinógeno não é adequado, pois não se trata de alucinações, mas de estado alterados de consciência nos quais pode-se interagir com outras realidades de uma forma funcional e pragmática na busca por conhecimento e energia. Uma alternativa poderia ser o termo enteógeno, que nos remete a uma jornada interior pela qual exploramos aspectos mais vastos de nosso ser envolvendo outros aspectos da consciência.

² Ver sobre o regulamento do nagual de três pontas.



Sagrado Feminino: Kali.

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